Condenação em acidente de trânsito é emblemática

Jurados reunidos em Curitiba aceitaram a tese da acusação, de que Carli Filho assumiu o risco de matar os dois jovens, ao dirigir alcoolizado e em alta velocidade

O deputado em destaque matou dois em 2009. Ele estava bêbado e seu carro estava quase em 170 Km/H

RIO / CURITIBA - Na madrugada de 7 de maio de 2009, após beber incontáveis taças de vinho, o então deputado estadual pelo PSB do Paraná Luiz Fernando Carli Filho, de 26 anos, deixou o Edvino Wine Bar, em Curitiba, tão trôpego que chegou a se desequilibrar e cair. Mesmo assim, assumiu o volante de seu Passat e partiu em disparada. Pouco depois, o carro, “voando” a uma velocidade estimada entre 160 e 170 quilômetros por hora — onde o limite era 60 —, “decolou” num ressalto da pista, subiu cerca de um metro e meio e despencou em cima do Honda Fit em que estavam Gilmar Rafael Souza Yared, de 26 anos, e Carlos Murilo de Almeida, de 20. A violência do choque foi tamanha que os dois ocupantes do Honda morreram na hora. Carli Filho sofreu ferimentos graves, mas sobreviveu.

A morte dos dois jovens está longe de ter sido uma fatalidade. Como ficou comprovado nos autos, Carli Filho estava com a carteira de habilitação suspensa, pois tinha 130 pontos no prontuário — seis vezes mais que o necessário para perder o direito de dirigir, de acordo com as normas do Código de Trânsito Brasileiro. Entre 2003 e 2009, havia acumulado 30 multas, sendo 23 por excesso de velocidade. Segundo a acusação, o parlamentar ainda estaria falando ao celular no momento do acidente.

Apesar da penca de evidências, o caso virou um símbolo da impunidade no trânsito e também do poder que réus ricos e influentes têm para escapar às punições impostas aos cidadãos comuns. A defesa protelou o quanto pôde o julgamento. Foram 34 recursos em quase uma década. “Os meninos morreram em dois segundos, e o caso aguarda um desfecho há nove anos”, disse à revista “Época” desta semana o promotor Marcelo Balzer Correia. As manobras foram muitas. Advogados de Carli Filho também conseguiram retirar dos autos o laudo que atestava a embriaguez. A quantidade era de 7,8 decigramas de álcool por litro de sangue, quatro vezes mais que o permitido naquela época. Alegaram que o exame tinha sido feito quando o motorista estava inconsciente.

Por tudo isso, é emblemática a condenação de Carli Filho a nove anos e quatro meses de reclusão. Durante o julgamento, anteontem e ontem, na 2ª Vara do Tribunal do Júri, em Curitiba, os sete jurados foram unânimes em aceitar que o então deputado assumiu o risco de matar ao dirigir alcoolizado e em alta velocidade. A defesa sempre insistiu em homicídio culposo, sem intenção de matar. Nesse caso, a pena seria mais branda.

O próprio Carli Filho disse, durante o julgamento, “que os jovens não tinham intenção de morrer, e que ele não tinha intenção de matar".

Portanto, não deixa de ser um marco a decisão do Tribunal do Júri de Curitiba. Apesar de ter um Código rigoroso, o Brasil continua a ser um dos campeões mundiais de acidentes de trânsito. E a impunidade é um fator importante para isso. Mas essa situação pode estar começando a mudar.


Fonte: Editorial de o Globo - 01.03.2018 

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Jota Sales, Romildo Nascimento, Gomes Silva, Lázaro Leyson e Morib Marcelo